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KEN HUGHES - Precisamos de arriscar mais

"De ser mais rápidos, mais criativos, inovadores e de arriscar, nesta indústria avessa a riscos"

07/05/2019

Reconhecido como uma das maiores autoridades mundiais em comportamento do consumidor e do comprador, é consultor de algumas das maiores marcas do mundo. Ken Hughes combina a compreensão da psicologia do consumidor e cibernética com antropologia digital, economia comportamental e futurologia do retalho para explorar as necessidades do novo consumidor e prever que mudanças vão surgir no setor. No VI Congresso da Associação Portuguesa de Centros Comerciais, fará uma intervenção sobre Inteligência Artificial. Nesta entrevista, olha para as mudanças que ocorreram no comportamento do consumidor na última década e antecipa a próxima, para concluir que, a breve prazo, vamos passar muitas decisões das nossas vidas para assistentes virtuais e chatbot – e que o retalho precisa de tornar-se mais inovador e de arriscar.

 

 

Como caracteriza as mudanças que ocorreram no consumidor na última década?

Nos últimos 10 anos, o consumidor tornou-se mobile first e digital first. Nesse período de tempo, existiram várias disrupções no sector do retalho, não devido às alterações da tecnologia no lado das operações de retalho, mas porque o próprio consumidor se tornou mais expectante em relação a serviços e produtos.

 

O consumidor espera novidades em permanência, e que tudo funcione com um clique ou deslize – está habituado a que tudo possa ser obtido imediatamente, como acontece no Google Maps ou no YouTube. Esta expectativa não se altera quando se trata de uma loja física. O consumidor continua a valorizar uma experiência imediata, instantânea, num toque ou clique e sem complicações.

 

Olhando para o que mudou na última década, podemos afirmar que os consumidores que agora têm 18-20 anos são muito mais exigentes, e esperam que marcas e empresas os acompanhem na sua jornada de compra, que prevejam as suas necessidades, que os conheçam e que criem com eles uma ligação pessoal. Isto quer dizer que as marcas e as empresas devem potenciar as informações de que dispõem e melhorar a experiência do cliente.

 

Precisamos que os consumidores partilhem a nossa história com o mundo nas suas redes sociais e para isso necessitamos de assegurar que as suas experiências com os produtos e serviços são as melhores. Isto é o novo normal. Se há 10 anos os clientes pagavam por um produto e ficavam felizes com ele, hoje essa interação é apenas uma transação, sendo necessário incluir outros elementos de prazer, experiência de utilização e personalização de oferta para que os consumidores sintam valor adicional no produto.

 

Como antecipa o consumidor do futuro, num horizonte de cinco a 10 anos?

Acredito que, no futuro, os consumidores venham a tornar-se cada vez mais expectantes. A Inteligência Artificial (IA) será a próxima mudança de nível. Vamos passar muitas decisões das nossas vidas para assistentes virtuais e chatbots e para os sistemas de IA que já existem nas nossas vidas. Muitos consumidores ainda não perceberam que já entregaram as suas decisões aos algoritmos: o Facebook recomenda-nos quem devemos ter como amigo, a Netflix diz-nos que conteúdo devemos ver, o LinkedIn diz-nos onde podemos trabalhar e o Tinder diz-nos até quem podemos amar… Todas estas coisas estão a acontecer tendo como base os algoritmos que vão seguinte a nossa vida e o que fazemos.

 

Deste modo, acho que vamos assistir a um consumismo no qual o consumidor entrega a tomada de decisão diretamente às máquinas, o que é perigoso porque assim como vamos influenciar o consumidor a decidir quando depois são as máquinas a tomar as suas decisões finais? Isto vai ter um impacto enorme no retalho. Estas alterações vão catalisar o e-commerce para um nível ainda mais elevado e vão também exigir que o foco seja maior na interação humana. As interações de médio e alto nível tornar-se-ão mais importantes e como tal veremos retalhistas a desenvolverem experiências de consumidor além do que conhecemos atualmente. As interacções vão passar a ser mais valorizadas, uma vez que serão mais escassas. Para além disso, acompanhar e compreender os consumidores que utilização a voz como interacção principal com a tecnologia será um aspecto importante e interessante a ter em consideração.

 

Assim, estão a acontecer muitas coisas interessantes: a tecnologia irá alterar continuamente o sector do retalho e, em última análise, o consumidor vai tornar-se mais expectante à medida que a tecnologia evolui. No retalho, precisamos de nos tornar mais inovadores.

 

 

Como é que os centros comerciais e a indústria física do retalho devem responder às aspirações do futuro consumidor?

Acho que um dos problemas no retalho é que somos extremamente lentos na mudança. Ainda mantemos o mesmo modelo de "nós construímos as lojas, vocês vêm até nós". Isso mudou nos últimos 10 anos, os consumidores esperam que sejamos nós a ir ter com eles. Acredito que a economia por assinatura e a economia partilhada estão apenas no início e, por isso, precisamos nos questionar: "Qual o motivo para um comprador entrar na nossa loja?". Devemos começar todos os dias com esta questão e se a resposta for “porque temos produtos e serviços para comprarem”, então temos problemas, porque se é isso que estamos a oferecer, qualquer outra plataforma pode fazer o mesmo. Precisamos de dar aos clientes uma razão para entrarem na nossa loja e esta realidade que vai continuar no futuro. Precisamos de ser mais rápidos, mais criativos, inovadores e arriscar numa indústria que é muito avessa a riscos, uma vez que existem muitos investidores que querem, obviamente, resistir a activos imprevisíveis.

 

Ou seja, precisamos de melhorar e investir em inovação. O consumidor está a mudar e não podemos deixar que o retalho se mantenha com as mesmas estruturas dos últimos 20 ou 30 anos. Esta é a parte interessante de trabalhar no sector de retalho nos dias hoje.

 

 

Acha que o digital vai matar o retalho físico ou vai complementá-lo?

100% complementar. É claro que existem alguns retalhistas físicos que vão terminar, mas os retalhistas inteligentes já percebem que o consumidor actual vive em dois mundos: um físico e um digital. Esse mundo "phygital" que os consumidores ocupam, deve ser tido em conta pelos retalhistas. Existem apenas dois lados da moeda. E se o retalhista tem um negócio físico e deve ter também uma forte presença digital, também o retalhista com grande presença no digital tem de converter esse tráfego em visitas às lojas físicas, não podendo ser realidades concorrentes.

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